Há luz no fim desse túnel?
Apesar do fato de que continuaremos no restante do ano a conviver com más notícias no cenário econômico, haverá perspectivas positivas mais adiante se certas medidas foram postas em prática agora.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu por unanimidade aumentar a taxa Selic para 14,25% ao ano. Até aí, nenhuma novidade: o Copom vem elevando de forma continuada essa taxa desde a reunião de 10 de outubro de 2012, quando a Selic situava-se em 7,25%.
A novidade é o anúncio pelo Comitê de que a nova taxa permanecerá inalterada por um período indeterminado. Não havia consenso no mercado de que o ciclo de alta dos juros teria um paradeiro imediato. Se não causou surpresa, também não era inteiramente antecipada.
Essa definição, ao contrário do que se esperaria, não dissipou incertezas. Da última vez que o Copom anunciou que a taxa ficaria inalterada por período indeterminado, ela voltou a ser alterada três reuniões depois.
Agora, o quase simultâneo anúncio do primeiro déficit primário das contas públicas nos últimos 18 anos à elevação da Selic, obriga uma revisão dos cenários elaborados pelos economistas do mercado.
Há duas considerações importantes a registrar. A primeira, já totalmente assimilada, refere-se ao curto prazo, na verdade não tão curto assim: não há qualquer indicação de que poderá se materializar um saldo primário positivo em 2015. Isso não quer dizer que haverá uma deterioração das contas fiscais ainda maior do que se antecipava no início do ano.
Há um espaço significativo para a geração de receitas não recorrentes ainda em 2015, mesmo que somente no conceito de competência –isto é, vendas de ativos da União cuja entrada em caixa somente venha a ocorrer parcialmente esse ano e o restante em anos vindouros. Para isso será necessário celeridade na elaboração de editais de vendas desses ativos.
É claro que, por maiores que sejam as receitas não recorrentes, isso não resolve o problema central do desafio fiscal, a geração de receitas correntes e o corte de despesas também correntes suficientes para a geração de um saldo primário positivo.
O que a venda de ativos da União poderá fazer é gerar um intervalo de tempo para que as medidas fiscais em andamento e a recuperação do PIB viabilizem um saldo positivo nos anos vindouros.
No longo prazo, trata-se de aproveitar a crise para tornar politicamente viável as reformas necessárias para remover os obstáculos estruturais ao nosso desenvolvimento.
Por paradoxal que possa parecer, nossa história mostra que as grandes reformas ocorreram em decorrência de desafios extremos que precisavam ser enfrentados para assegurar a retomada do crescimento com estabilidade de preços e no balanço de pagamentos.
Assim foi em 1964-65, quando as reformas introduzidas criaram o Banco Central, permitiram a criação de um mercado primário e secundário para a dívida pública e controlaram uma inflação que ameaçava desgarrar.
Posteriormente, com a introdução do regime de minidesvalorizações cambiais, encontrou-se uma solução possível para sustentar o crescimento das exportações e da estabilidade das contas externas.
Mais recentemente, após as diversas crises externas que assolaram o país na década de 1990, introduzimos com sucesso o regime de câmbio flutuante.
É esse regime que tem, na prática, permitido que não tenhamos problemas de balanço de pagamentos que poderiam estar ampliando os problemas de origem fiscal que já temos.
A esse respeito é importante apontar que já há mostras de um início de recuperação das exportações após a recente depreciação do real.
Essa recuperação é importante porque atenua as dificuldades decorrentes do que parece ser um ciclo de alta de preços de nossas principais commodities de exportação.
E é tão ou mais importante por razões internas, ao permitir às empresas um acesso ao mercado internacional para a colocação de seus produtos em um momento em que iniciamos um forte ciclo de aumento do desemprego.
Portanto, a despeito do fato de que continuaremos no restante do ano a conviver com más notícias no cenário econômico, há perspectivas positivas mais adiante se certas medidas foram postas em prática agora.
Essas medidas incluem a ampliação da venda de ativos do Estado para servir de ponte entre o momento atual e o momento seguinte, quando cortes de despesas já terão impacto positivo nas contas fiscais; quando a retomada do crescimento, ainda que tímida, permitir um crescimento da receita; e reformas estruturais possam ser implementadas.
A possível perda do grau de investimento já provocou efeitos positivos, no sentido do apoio dos governos estaduais ao ajuste econômico. Compete agora ao Executivo dar mostras que estará à altura dos desafios que estamos a enfrentar.