Fundamentos para reformulação da política macroeconômica
Nosso artigo de 2010 apontou que o Brasil vivia então um “subdesempenho satisfatório”, pois o contentamento popular e a euforia demonstrada e difundida pelo governo federal não condiziam com o frágil status da economia do País segundo vários indicadores apresentados. E argumentava que tal percepção deveria fundamentar a ação política para reverter tal subdesempenho.
Propôs-se então uma política macroeconômica em que o esforço fiscal do governo fosse aferido principalmente pelo seu efetivo engaja- mento em ampliar a poupança e os investimentos públicos, sem aumento da carga tributária.
No detalhe, defendeu-se ampliar a poupança nacional e os investimentos públicos e privados como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). O desempenho fiscal do governo passaria a ser avaliado também pelo seu déficit nominal e sua dívida. E não pelo enganoso superávit primário, que o alardeado como a “poupança que o governo faz para pagar parte dos juros da dívida”. Ora, o governo não poupa nada, é sempre deficitário, e ao longo dos anos tal superávit veio de um persistente aumento da carga tributária.
No governo Dilma, de novo o crescimento do PIB tem sido marcado por taxinhas. As taxas de poupança e investimento relativamente ao PIB também se reduziram, e acendeu-se a luz amarela nas contas externas. Um aspecto positivo foi que o “subdesempenho satisfatório” cedeu espaço à insatisfação e aos protestos que marcaram o País desde junho de 2013.
Mas, ao invés de ajustes na direção proposta, a política macroeconômica manteve medidas do período de euforia pré-crise internacional, com essa euforia também se mostrando em 2010. Isto, sem perceber que algumas não mais tinham a mesma eficácia, como a expansão do crédito contida pelo endividamento agravado, e que a ampliação das transferências governamentais em dinheiro (via INSS e outros gastos sociais), havia comprometido seriamente a disponibilidade de recursos para o investimento público.
Só em 2012, depois de 10 anos de governos petistas, “caiu a ficha” de que a carência de recursos governamentais tornou indispensáveis as concessões de serviços públicos. Assim, em agosto de 2012 veio ambicioso programa nessa linha, voltado para ferrovias e rodovias, mas que se atrasou e permanece com problemas de implementação, em particular o das ferrovias.
Também não avança outro programa voltado para os portos, e só uns poucos aeroportos foram concedidos à gestão privada. Louve-se, entretanto, que o governo tenha o acordado para a realidade de uma infraestrutura muito carente de melhorias. Outra iniciativa meritória foi a de reduzir a taxa básica de juros para níveis civilizados, mas tal iniciativa naufragou por má companhia, a de uma política fiscal expansionista que não deu sustentação à redução da Selic.
A gestão Dilma também se marca por forte intervencionismo nos mercados, alimentado por sua desconfiança quanto ao setor privado. Daí vieram sérias distorções em prejuízo dos setores de petróleo e gás, de energia elétrica e o sucroenergético. O governo excedeu-se também na chamada contabilidade criativa, como na cobertura de despesas permanentes com receitas transitórias e nas implicações orçamentárias do enorme orçamento paralelo de crédito ao BNDES. Tal criatividade é destrutiva da indispensável confiança dos agentes econômicos nas políticas governamentais.
Em retrospecto, comparando-se a situação atual com a de 2010, percebe-se que às circunstâncias externas agora bem menos favoráveis do que no período Lula somou-se uma ainda mais temerária condução da política econômica. Com a piora do cenário externo, os caminhos da política macroeconômica se estreitaram, e não há o que fazer senão buscar um crescimento mais sustentado pelo esforço interno, para o que nossas propostas de 2010 continuam atuais. Em sua essência, enfatizam o aumento da poupança e do investimento como proporção do PIB a partir principalmente da arregimentação de forças internas, que poderão ser desencadeadas com a adequada reorientação da política macroeconômica.
Mas, a carência de recursos para investimentos públicos é enorme. Assim, estendendo o que foi proposto em 2010, as concessões precisam ser fortemente ampliadas, e adotadas inclusive na exploração do Pré-sal. Neste caso, a adoção do modelo de partilha com monopólio operacional da Petrobras exigiu desta uma capacidade que não está em condições de oferecer a médio prazo. E o longo prazo não convém à urgente necessidade que o país tem dos recursos do Pré-sal.
Além de concessões, cabem também mais parcerias público-privadas, e forte empenho no aprimoramento da infraestrutura de transporte e logística do País, onde as muitas carências se agravaram. E, ainda, na expansão da construção civil, dadas a enorme dimensão da cadeia produtiva do setor e sua capacidade de transformar poupança em investimento, já que o setor é propício a financiamentos buscados pelos próprios interessados em adquirir imóveis e desenvolver obras de infraestrutura, entre outros casos.