Erros e acertos
Tivesse a política econômica seguido o bê-á-bá dos livros-texto de economia não seria agora necessário enfiar goela abaixo dos brasileiros um programa de ajuste que provocará queda na produção e desemprego
Na análise das causas e consequências do rebaixamento da nota de risco do país há muitos erros e acertos. O mais grosseiro dos erros consiste em dizer que o rebaixamento “não significa nada”.
E, como completou o ex-presidente Lula, o ajuste na economia provoca apenas “a queda na receita, mais arrocho, mais ajuste, mais desemprego, mais corte de gastos, mais não sei o quê. Não vem nunca mais educação, mais profissionalismo, mais investimento. Não vem".
Esqueceu-se, como foi observado por todos, que disse exatamente o oposto com relação à obtenção do grau de investimento pelo Brasil em 2008.
Ora, essa interpretação ignora dois fatos. Primeiro, que o ajuste é consequência direta dos erros e desacertos da “nova matriz econômica” do governo do seu partido.
Tivesse a política econômica seguido o bê-á-bá dos livros-texto de economia não seria agora necessário enfiar goela abaixo dos brasileiros um programa de ajuste que provocará queda na produção e desemprego – e, se ocorrer o que pretende a senhora presidente e o senhor ministro da Fazenda, mais impostos para a população em geral.
Segundo, que somente será possível retomar o rumo do crescimento sustentado após o saneamento dos brutais erros cometidos nos últimos anos.
A década de 1980 é justamente chamada de década perdida justamente porque tínhamos o mesmo desequilíbrio fiscal e fomos incapazes, então, de dar uma solução para ele.
Por mais incrível que possa parecer, o ex-presidente não está sozinho em sua apreciação das causas e consequências da perda do grau de investimento.
Com outras palavras, um ex-secretário de política econômica do ministério da Fazenda afirmou que a situação econômica piorou após o ajuste e que foi ele o responsável pela perda do grau de investimento. A causa estaria, em suas palavras, no “desajuste do ajuste”.
Para esse economista, o objetivo do ajuste era restaurar a confiança do setor privado e as expectativas desses agentes econômicos, o que não ocorreu após o ajuste.
Ora, é impossível ignorar que, depois de um ano inteiro de estagnação da economia e com a inflação em alta, se possa dizer que o ajuste tenha causado os problemas, como o crescimento da dívida e o aumento do desemprego.
Além disso, esse argumento pressupõe identificar que ajuste foi feito até agora. Ao que se saiba, membros da própria equipe econômica se opuseram a qualquer medida de correção dos erros cometidos e ainda nem começamos o ajuste real – que implicará cortes nas despesas obrigatórias, responsáveis por 79% dos gastos do governo federal. Por enquanto há muita retórica e pouca ação.
Mas há também muitas análises acertadas. Vários analistas vêm apontando desde o ano passado que o rebaixamento pela S&P era somente questão de tempo. Havia indicadores públicos disponíveis para quem quisesse ver para onde nos encaminhávamos.
Um deles, a evolução do CDS do Brasil – “Credit Default Swap”, tipo de derivativo de crédito que serve como forma de proteção contra inadimplência – mostrava que o mercado já havia precificado em parte os riscos brasileiros. O outro indicador, mais evidente ainda, é a evolução da taxa de câmbio.
Dessa forma, só se surpreendeu quem quis e de fato surpreende que o governo tenha sido pego de surpresa com a mudança da nota de risco brasileira.
Outros indicadores menos visíveis completam o quadro. A dívida pública caminha rapidamente para o patamar de 70% do PIB, insustentável mesmo em condições normais de crescimento. O quadro fica pior ao se constatar que o crescimento da despesa deve ultrapassar R$ 100 bilhões e a receita tributária está em queda com a recessão na economia.
Por tudo isso, como disse a economista Monica de Bolle, “agora o Brasil vai comer o pão que o diabo amassou, porque a perda do grau de investimento é um atestado da fragilidade econômica que o governo não reconhece”.
A pergunta relevante, diante de tantos problemas que agora emergem, é: o que fazer?
Não adianta chorar sobre o leite derramado, o grau de investimento está perdido para uma das agências de classificação de risco. Por enquanto, as duas outras principais agências mantêm o grau de investimento. Até quando, o tempo dirá.
Há ainda tempo para indicar que medidas serão tomadas, ainda que somente produzirão resultados mais adiante. Não há qualquer alternativa a essa ação.