As reviravoltas da política econômica
A taxa Selic deverá aumentar novamente. A política econômica está à deriva nesse final do primeiro mandato da presidente. O governo não tem recursos sequer para pagar as despesas obrigatórias
Promessas de eleição é uma coisa, a dura realidade, outra. Isso se aplica tanto às coisas comezinhas da vida como à política econômica. Em razão desse fato, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) aumentou a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, situando-a agora em 11,75%, e o Executivo propôs ao Congresso mudanças importantes na área fiscal.
Com relação ao aumento juros, a grita foi grande. O PIB está estagnado, argumenta-se, e esse não seria o momento de subir os juros, mas, ao contrário, de baixá-los. De pouco serviu o comunicado do Copom de que leva tempo para que façam efeito as medidas de política monetária e que “o esforço adicional de política monetária tende a ser implementado com parcimônia”.
Se assim for, o vigor da política de juros poderá ser daqui para frente mais moderado, mas condicionado a novos avanços na política fiscal e a uma taxa de câmbio bem comportada. Caso não haja grande progresso no controle dos gastos do governo, ou se o câmbio desvalorizar-se de forma acentuada, a moderação poderá dar lugar a uma nova rodada de aumentos acentuados na taxa Selic.
É generalizada no mercado a expectativa de que a Selic irá subir mais 0,5 ponto percentual na próxima reunião do Copom, programada para janeiro, e mais 0,25 ponto percentual na reunião de março.
É claro que a elevação dos juros tem a ver com a inflação, que teima em permanecer acima do teto da meta fixada pelo próprio governo. Desde 2010 a inflação não mais retornou ao centro da meta (4,5% ao ano). Desde agosto o IPCA está acima do teto da meta (6,5%).
A inflação deverá aumentar quando os preços administrados – combustíveis e transporte, entre outros – forem corrigidos. Também preocupa às autoridades a recente evolução da taxa de câmbio. O governo tem hoje mais de 100 bilhões de contratos de swaps cambiais em aberto na praça, e a contínua depreciação do real traz um significativo risco fiscal para o governo.
É importante considerar os efeitos da elevação esperada da taxa de juros sobre a atividade econômica. Ao contrário do que muitos afirmam, o impacto maior não se dará sobre os investimentos. A experiência mostra que as empresas investem primordialmente com lucros acumulados. O uso de crédito, sempre que possível, deve privilegiar linhas subsidiadas, como as oferecidas pelo BNDES. O investimento retraído explica-se mais pela forte queda dos lucros das empresas nos últimos dois anos que por qualquer outro fator.
O grande efeito da subida dos juros é reduzir a demanda por crédito que estaria alimentando a inflação. Como todas as taxas de juros no mercado financeiro estão interligadas, o aumento da Selic transmite-se a todas as operações de crédito. Crédito mais caro torna mais caro todos os produtos financiados, sendo maior o efeito para bens que gozam de prazos longos de financiamento.
Dessa forma, ao combater acertadamente a inflação, se obterá também o efeito colateral de desestimular a demanda por bens de consumo duráveis, justamente um dos carros chefe da política econômica da presidente nos últimos quatro anos.
Em outra frente, o governo pôs em prática o que muitos consideram uma nova manobra fiscal para assegurar recursos para o pagamento de despesas obrigatórias, como o pagamento dos servidores e de benefícios previdenciários.
Trata-se de modificação de regra até então em vigor que determinava que saldos não utilizados de um determinado tributo somente poderiam utilizados para o custeio de despesas para o qual estava destinado. Agora, pela Medida Provisória nº 661, esses saldos podem ser utilizados para a cobertura de outros gastos obrigatórios.
Junto com essa mudança de regra, o governo decidiu também fazer um novo aporte de R$ 30 bilhões ao BNDES. O objetivo é permitir que se apure, até o final do exercício, a nova meta superávit primário (R$ 10 bilhões).
Essas medidas apenas reforçam a percepção de que a política econômica está à deriva nesse final do primeiro mandato da senhora presidente. Fica no ar a sensação de que o governo não tem recursos sequer para pagar as despesas que a Constituição rotula de obrigatórias – o pagamento de salários e encargos dos servidores, os benefícios previdenciários e os juros e encargos da dívida pública.
Em 1889, Aristides Lobo, o propagandista da república, afirmou que o povo assistiu bestializado à forma como foi proclamado o novo regime no 15 de Novembro. Assistimos nós, também bestializados, a gravidade da situação fiscal, negada de forma tão peremptória durante a campanha eleitoral.