A alta dos juros
O Banco Central subiu a taxa Selic não por pessimismo quanto ao ajuste fiscal, mas sobretudo para combater a inflação
Embora fosse unânime no mercado a expectativa de que o Banco Central subiria a taxa básica de juros em meio ponto percentual, há muitas interpretações conflitantes a respeito da causa desse novo aumento.
Por exemplo, alguns acreditam que a razão para a alta é a desconfiança, no governo e na sociedade, de que as medidas de ajuste fiscal não serão suficientes para acertar as contas do governo. Se não é possível conter o excesso de gastos do setor público, a alternativa seria reduzir os gastos das famílias e das empresas.
Se essa interpretação fosse correta, o instrumento utilizado é poderoso. A alta da Selic se transmitirá às demais taxas de juros praticadas no mercado. Os investimentos serão desincentivos, porque o pagamento do empréstimo para financiá-lo pode tornar-se mais caro que o retorno obtido pelo investimento – especialmente no quadro recessivo que vem pela frente.
As famílias sentirão no bolso que a prestação dos eletrodomésticos já não caberá no orçamento familiar. Isso para não falar no carro novo, cujo pagamento por prazo longo inviabiliza sua compra.
Tudo isso é verdade, mas não é a falta de confiança no ajuste fiscal que motivou o aumento da Selic para 12,75% ao ano. O aperto monetário praticado pelo Banco Central não começou essa semana, mas vem desde outubro, quando se iniciou, de surpresa, uma nova rodada de alta dos juros.
Naquela época não se falava em ajuste fiscal e a senhora presidente nos assegurava que tudo ia bem na economia.
Outros veem na desvalorização cambial a decisão do Banco Central de mudar novamente o patamar da Selic. De fato, em outubro, o real havia se desvalorizado, e essa desvalorização coincidiu com o início do aperto monetário.
É claro que a continuada desvalorização do real requer que os juros subam. Mas o canal de transmissão do câmbio para os juros passa pela inflação. É a aceleração da inflação que está motivando a subida dos juros.
O Banco Central tem por principal missão manter o poder aquisitivo da moeda brasileira. Para isso, seu principal instrumento de controle é a taxa de juros.
Imaginava-se que a inflação aceleraria no primeiro trimestre em decorrência do reajuste dos preços administrados, especialmente da energia elétrica e dos combustíveis. Essa correção, trazendo de volta à realidade esses preços, não se extinguiria em seu impacto inicial.
De fato, o aumento de dois insumos tão importantes transmite-se pela cadeia produtiva e alcança um grande número de outros preços. Há óbvios, como as tarifas de transportes públicos; mas há uma infinidade de produtos industriais, cujos processos produtivos são intensivos no emprego da energia, que sofrerão um forte impacto com a correção dos preços anteriormente represados.
Não há dúvidas de que o ajuste fiscal poderá sofrer sobressaltos, como apontei recentemente nesse espaço. Um deles é a transformação da medida provisória que transferia os encargos previdenciários da folha de pagamento para o faturamento em projeto de lei. Essa mudança afetará 50 setores industriais. A votação do projeto tomará pelo menos 90 dias, caso seja aprovado, tendo efeitos agora somente três quartas partes do ano.
Embora a forte desvalorização do real já esteja tendo impacto nos preços, especialmente dos importados, essa perda de poder aquisitivo do real tem seu lado bom.
Com a queda generalizada dos preços das commodities minerais e alimentos, nossas exportações encolheram. Tivemos pela primeira vez em muitos anos um déficit na balança comercial em 2015. A desvalorização eventualmente produzirá uma retomada das exportações, especialmente de bens industrializados, mas também dos produtos primários.
Isso impedirá que tenhamos também um problema de balanço de pagamentos a somar-se aos problemas já conhecidos de desequilíbrio fiscal e aceleração da inflação.
Moral da história: a alta dos juros decorre de muitas causas, a principal delas, a inflação. Não é um remédio sem efeitos colaterais, especialmente sobre a atividade econômica.
Os efeitos colaterais englobam também o aumento da despesa do governo com o pagamento de juros e encargos sobre a dívida pública. Não há alternativas conhecidas, a menos que nos acomodemos e venhamos a abrir mão da mais importante conquista do Plano Real, o fim da inflação.