Por dentro do Jardim Paulista, a Manhattan paulistana
O bairro tem comércio de luxo e popular, mais de uma centena de bancos, restaurantes e bares estrelados e um potencial de consumo próximo de R$ 7,5 bilhões anuais
Duas São Paulo coabitam na metrópole. Uma é próspera, movimentada, repleta de estabelecimentos comerciais e de serviços, atrações turísticas, gastronômicas e de entretenimento. A outra carece de segurança pública, infraestrutura, empresas e empregos.
Essa comparação pode se espelhar em diferentes bairros da capital paulista, mas em poucos será tão contrastante quando se compara o Jardim Paulista, na zona oeste, e o Jardim Ângela, na zona sul, retratados nesta série do Diário do Comércio.
Com menos de um terço da população, o Jardim Paulista detém um índice de potencial de consumo que se aproxima dos R$ 7,5 bilhões, fatia equivalente a 2,4% do total do município.
"Ali se concentram 3,7% dos domicílios paulistanos da classe A", afirma Tadeu Masano, professor da FGV/SP e presidente da consultoria Geografia de Mercado, que estabeleceu comparações e fez simulações para esta série.
Possui mais de uma centena de bancos, 2,2 mil estabelecimentos comerciais e quase 8 mil de serviços, que empregam 220,5 mil pessoas -o que representa 4,5% dos empregos e 4,8% da massa salarial em São Paulo.
Atualmente 95 mil habitantes desfrutam dos privilégios proporcionados pelo terceiro maior rendimento médio mensal entre os bairros da Capital, de R$ 6.647,48, de acordo com o IBGE –só perde para a Vila Nova Conceição e Moema.
O Jardim Paulista tem uma extensão de pouco mais de 6 quilômetros quadrados. São quarteirões arborizados, com casas na parte mais baixa, dezenas de apartamentos, lojas, restaurantes, bares e os hotéis mais importantes e luxuosos de São Paulo.
Está inserido na badalada e chique região dos Jardins.
Quem mora no bairro, vive em média 24 anos a mais do que um residente do Jardim Ângela, de acordo com levantamento da Rede Nossa São Paulo, feita em outubro deste ano.
O Jardim Paulista nasceu no começo do século 20, com projeto urbanístico e arquitetônico da Cia City. Primeiro, veio o Jardim América. Em seguida, vieram os jardins Europa, Paulistano e, por último, o Paulista, o mais próximo da Avenida Paulista.
Mas também convive com seus próprios contrastes.
Tem comércio popular e de luxo. Mansões e moradores de rua. Condomínios novos, apartamentos enormes e prédios mais antigos.
O bairro nobre é servido por hospitais bem equipados como o Santa Catarina, Nove de Julho, Paulistano, Beneficência Portuguesa, por exemplo. Seus moradores têm à disposição as estações de metrô Paraíso, Brigadeiro, Trianon Masp, Consolação e Clínicas, só para citar as mais próximas.
Os restaurantes badalados da cidade estão lá, como o Amadeus, Aizomê e Arábia, Brasil a Gosto, Dalva e Dito, D.OM, a Figueira Rubayat, Fasano, Gero, Le Jazz, Le Vin, Osteria del Petirrosso, Piselli e Ritz.
É lá que Ricardo Almeida instalou seu ateliê em 2012. Saiu da Vila Nova Conceição e ocupou o lugar que era da marca Giorgi Armani. O ponto, guardado por dois seguranças na entrada, é onde o estilista faz atendimento personalizado a clientes que podem pagar R$ 2 mil por um blazer live, por exemplo.
O espaço da moda de Ricardo Almeida fica bem na esquina da Bela Cintra com Oscar Freire. Há controvérsias entre moradores e comerciantes para saber a que bairro ela pertence: Cerqueira César, Jardins, Pinheiros? A pergunta é rapidamente respondida por quem frequenta a região, ou tem algum estabelecimento comercial pela luxuosa via.
“A Oscar Freire pertence aos Jardins. Até por uma questão de status”, diz o dono de um restaurante, que não quis se identificar.
A Oscar Freire é considerada uma das mais luxuosas e caras ruas do mundo. São 2,5 mil metros de extensão, que acomodam marcas como Forum, Osklen, Ellus, H. Stern, Louis Vuitton, Dudalina, Mrs. Kitch, Broosksfield, Siberian, Crawford, entre outras. As despesas com vestuário somente dos moradores da região montam a R$ 286 milhões anuais.
Revitalizada em 2006, as calçadas ficaram mais largas. A rua ganhou 72 ipês das cores roxa, amarela e branca. Lá, carro não pode estacionar. A prioridade é para os pedestres. O desfile de pessoas com seus cachorros alegra os finais de tarde.
Os sinais de fim da crise econômica ainda não são visíveis por lá. Como em outros pontos da metrópole, o Jardim Ângela, por exemplo, a expectativa dos comerciantes é que o Natal traga uma avalanche de consumidores.
O que se vê por lá, por enquanto, é a corrida de jovens ao Empório Frutaria. Dezenas deles saem das badaladas academias de ginástica que existem na região e vão em busca de alimentação saudável. O gerente Matheus conta que a casa foi aberta há seis meses. “Mas já virou atração aqui”, diz.
O açaí na cumbuca, com frutas, é o carro chefe do estabelecimento. A moçada gasta, em média, R$ 100,00 cada vez que entra no empório.
CLASSE AA
Maria Rita, é gerente da Siberian, rede de lojas de roupas femininas. Pode-se dizer que Siberian e Crawford formam um casal. Dividem o mesmo espaço físico. De um lado, o esquerdo de quem entra, fica a Siberian. Do outro, a Crawford, que só vende artigos masculinos.
Quem entra nas duas lojas, segundo Maria Rita, tem entre 30 e 35 anos. “São pessoas das classes AA. Pelos preços, os clientes das duas lojas têm mesmo de exibir uma boa condição financeira.
“Os preços aqui variam de R$ 400,00 a R$ 3.000,00”, conta. Nada de pagar aluguel. Todas as lojas da Siberian e Crawford ocupam espaço físico próprio.Trata-se de estratégia financeira das duas empresas.
“Para nós não é interessante o acúmulo de clientes. Priorizamos qualidade e não quantidade. Sabemos que quando o nosso cliente entra aqui, com certeza vai comprar. Ele entra sabendo o que quer. Não reclama do preço. E costuma pagar à vista”, diz ela, rodeada por Kelly Yamada, atendente, e o sub gerente Felipe Ferreira.
Tem também opções para bolsos menos recheados. A “prainha paulista”, na esquina da Alameda Joaquim Eugênio de Lima e Avenida Paulista, é repleta de bares, como o Asterix, o The View, que fica bem no alto, no 30º andar do Flat Transamérica e coloca à disposição da clientela uma interessante quantidade de vinhos e drinques.
E ainda tem o Skye, um misto de restaurante, bar e balada.
A violência não é problema por lá. A questão foi resolvida com segurança privada. Ou seja, os próprios moradores pagam para viver sem sobressaltos.
No século 16, o Jardim Paulista era apenas um caminho para o Ibirapuera. Posteriormente, a região passou a ser procurada por fazendeiros que buscavam terra para cultivar chá, tabaco e uva.
Durante o processo de venda e compra de terra, as famílias Pamplona e Paim viraram proprietárias de vários terrenos e batizaram a região de Jardim Paulista.
Pamplona acabou virando nome de rua e se manteve nos Jardins. Paim também virou nome de rua, só que no vizinho bairro da Bela Vista.
Quem tem o privilégio de morar no Jardim Paulista, desfruta ainda da avenida mais famosa da cidade. A Paulista ainda é o coração financeiro de São Paulo. Tem mais de 2.800 metros de comprimento, centros culturais, prédios imponentes, um parque, e o museu mais famoso da cidade, o Masp.
Construído nos anos 60, o prédio do Masp tem o maior vão livre do mundo. É lá que é realizada todos os domingos a feira de antiguidades. O acervo permanente do Masp tem obras de Renoir, Modigliani, Van Gogh, Portinari, entre outros consagrados pintores.
Quem anda pela avenida e imediações, pode visitar também centros culturais como o Centro Cultural São Paulo. Muito frequentado por jovens, tem shows, peças de teatro e filmes para todos os públicos e gostos.
E tudo pode ser aproveitado de graça ou a preços populares. Outras atrações artísticas podem ser apreciadas na Fiesp e Itaú Cultural. Os cinemas da região são os mais procurados da cidade. Estão na região o Caixa Belas Artes, Reserva Cultural, Espaço Itaú e Cine Livraria Cultura, entre outros.
No número 2001 da Avenida Paulista fica uma galeria com vinte lojas comerciais no andar térreo. Na sobreloja, quem mora ou trabalha na região tem à disposição uma área de alimentação, com todos os tipos de refeições.
Nas proximidades, há agências bancárias, o Ministério Público Federal, lojas de departamentos e o escritório da Presidência da República, em São Paulo.
Além do Conjunto Nacional, com inúmeras lojas, salas de cinema e a Livraria Cultura, sempre muito procurada por ávidos leitores, está lá uma unidade da Starbucks Coffee, onde o cliente de ótimo poder aquisitivo toma um café da manhã por R$ 30,00, em média.
No número 2001, as dificuldades são enormes para conseguir fazer uma entrevista gravada com qualquer um dos comerciantes. A burocracia da administração do condomínio exige permissão da síndica. Após uma longa espera, enfim, a entrada nos estabelecimentos comerciais é permitida.
A dona da Jade Presentes, Lee Wue, chinesa, é muito gentil. Fala português com desembaraço. Mas indica a gerente Leide Oliveira para falar com a reportagem.
Leide diz que a loja existe há 20 anos. Mostra otimismo com a chegada do Natal. “O movimento melhora. Muitas empresas compram kits de presentes para os funcionários”, afirma ela. O gasto médio de quem compra na Jade vai de R$ 5,00 a R$ 120,00. Mas há preços para todos os gostos e bolsos.
Na Kid Stock, logo em frente, Regina Takara pede um tempo para retocar a maquiagem. Ela vende roupas para crianças e avisa que é proprietária de outra unidade da Kid Stock, na Zona Leste. Os artigos de Natal estão sendo bem procurados.
Os preços das roupas infantis vão de R$ 10,00 até R$ 120,00. A loja emprega oito pessoas. A expectativa da dona e das funcionárias é que as vendas de Natal melhorem ainda mais. O otimismo se justifica pelo grande número de funcionários de bancos, de lojas e de repartições públicas que existem na região.
“Atendemos todos os tipos de público. Mas é claro que os funcionários de bancos e das repartições têm um poder aquisitivo maior”, diz Regina.
VÍDEO: William Chaussê/Diário do Comércio
FOTO: Reprodução/Google Mapas