Órfão aos 23, ele converteu um bufê em um grande food service
Após a morte trágica do pai, Antônio Faleiro Neto, hoje com 30 anos, fez do tradicional bufê Faleiro, de Belo Horizonte, uma empresa que abastece com salgados e pratos prontos redes como BR Mania, Carrefour e Pão de Açúcar
Véspera de Carnaval, 2011. O jovem Antônio Faleiro Neto, 23 anos, não imaginava que teria de colocar em prática, e de forma abrupta, toda a teoria adquirida no curso de Administração de Empresas, que acabava de concluir no Ibmec, hoje Insper.
O pai de Antônio Faleiro Neto, Antônio Faleiro Filho, 63 anos, dono de um dos bufês mais tradicionais de Belo Horizonte (MG), levou um tiro -e morreu - quando entrava na fábrica com o dinheiro para pagar o salário dos funcionários.
Depois de passar o carnaval mais triste da sua vida, Faleiro Neto, hoje com 30 anos, assumiu a direção do bufê Faleiro na quarta-feira de Cinzas de 2011, para dar continuidade ao negócio da família, fundado pelo avô, na década de 50.
Na época, o bufê, localizado no bairro Califórnia, em Belo Horizonte, operava em uma área de 2,8 mil metros quadrados, tinha 90 funcionários e cerca de 2 mil clientes.
A Fiat Automóveis, localizada em Betim (MG), era na ocasião a maior cliente da empresa. Comprava 5 mil salgados de 100 gramas cada, como coxinhas e empadas, diariamente, para os empregados.
Em apenas sete anos, o jovem empresário transformou um bufê tradicional em uma empresa de food service. Instalada em uma área de 7,2 mil metros quadrados, onde trabalham 170 funcionários, a empresa produz 120 mil salgados, 5 mil pratos prontos e 6 mil sobremesas a cada dia.
A Faleiro abastece atualmente 8 mil pontos de venda de gigantes, como as redes Carrefour, Pão de Açúcar e Extra, além de lojas de conveniência de postos da BR Mania, da Petrobras. Neste ano, lançou uma marca própria: Faleiro.
No depoimento a seguir, Faleiro Neto conta como foi sua jornada:
?PRIMEIROS PASSOS
"Na época [da morte do fundador] tínhamos 2 mil clientes e 90 empregados. Fiz uma reunião com todos os funcionários, que me deram um voto de confiança, mas com certa dose de cautela.
Os problemas de governança surgiram logo em seguida. Três gerentes pediram aumento de salário. Neguei. A primeira meta era manter a empresa e parar com tudo, até com os investimentos, para que pudesse ter o domínio da empresa".
?OBSTÁCULOS E ROUBO
"Os gerentes, que eram o cérebro da empresa, foram trabalhar na concorrência. Em seis meses, caiu o número de clientes, e o custo operacional aumentou. Descobri também que um alto profissional da área financeira estava roubando a empresa".
?OPORTUNIDADE
"Soube que a Petrobras estava atrás de empresa capaz de abastecer as lojas de conveniência da BR Mania. Era a alternativa que tinha para escapar do mercado local, já que meu concorrente só atuava em Belo Horizonte.
Fui com a cara e a coragem para o Rio de Janeiro. Visitei três prédios da Petrobras e, somente no quarto prédio, achei a divisão da BR Mania. Voltei no dia seguinte e, em dez minutos, vendi o meu projeto.
O bufê não tinha certificação de segurança no processo alimentar, o que era um ponto negativo. Dois a três meses depois, porém, eles me ligaram para atender os postos da região Sul do país, com a entrega de salgados de 100 gramas".
?EXPANSÃO DO NEGÓCIO - 1
"Os salgados, que chegavam congelados, foram muito bem aceitos pelos clientes da BR Mania.
Dois a três meses depois, a empresa pediu para abastecermos os postos do Nordeste, o que demandava uma logística bem mais complexa. Investimos em novos maquinários, com recursos próprios".
?EXPANSÃO DO NEGÓCIO -2
"Em 2012, a Petrobras desafia os fornecedores a criar pratos prontos para serem vendidos nos postos da BR Mania. Na loja de conveniência não havia fluxo de clientes na hora do almoço.
Conheci por acaso, na época, um dono de restaurante em BH, que servia uma ótima comida, e topou me ajudar a desenvolver os pratos.
O desafio era ter pratos, com carne, arroz e outro acompanhamento, que pudessem ser aquecidos no mesmo tempo e na temperatura, mantendo os ingredientes no melhor estado.
Ganhamos a concorrência para fornecer para mil lojas da BR, a partir de agosto de 2012, um ano e três meses após o falecimento do meu pai.
Não fiquei parado. Com o objetivo de diversificar a linha de clientes, procurei o Carrefour, que tinha a intenção de lançar pratos prontos com a marca própria.
A rede decidiu fazer uma auditoria na empresa e, para passar, eu precisava ter uma pontuação (de zero a 100) acima de 80. Consegui 23. Pensei: queimei meu filme".
?INVESTIMENTOS
"Se o Carrefour estava exigindo melhora nos meus processos, os outros clientes também iriam exigir. Decidi quebrar a fábrica inteira em 2013 e 2014 e investir em maquinário para controle de processos em cada fase de produção.
Se há possível problema de contaminação, em cada fase e produção, há um equipamento capaz de impedir, como peneiradores, detectores de metais e também para análises das mãos dos colaboradores.
Coloquei maquinários, troquei processos. Hoje nosso laboratório faz análise microbiológica e físico-química desde a matéria-prima até o produto final.
"Nossos funcionários fazem análise de saliva, epiderme, fezes, urina, sangue. Enfim, conquistamos padrão europeu de produção de congelados. O investimento foi da ordem de R$ 4 milhões nesta época, todo com capital próprio".
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?RESULTADOS
"Um ano depois, corri atrás novamente do Carrefour, que realizou nova auditoria na empresa. Consegui 87 pontos, e comecei a atender a rede.
Em seguida, passei a abastecer também a rede Spoleto, com a linha de sobremesas.
No ano passado, nos tornamos fornecedor exclusivo da BR em salgados, refeição e sobremesa em todo o Brasil.
Atendemos todas as padarias e rotisserias de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte das redes Pão de Açúcar e Extra.
E, para o Carrefour, produzimos toda a linha de pratos prontos para todas as lojas e atendemos as padarias e as rotisserias da rede em Belo Horizonte e Rio de Janeiro".
?PLANOS
"Crescer na região Sudeste e atender padarias e rotisserias em supermercados, com entrega de produtos congelados e prestação de serviço.
Não adianta a empresa ter um bom trabalho operacional, se o ponto de venda não sabe trabalhar com o produto.
A nossa entrega é centralizada, isso elimina custos. O custo que economizo, quero gastar com atendimento no ponto de venda. Quero ser parceiro das rotisserias e das padarias dos supermercados".
Faleiro Neto prefere não falar em faturamento da empresa, até porque nunca vai esquecer do que aconteceu com o pai, mas diz que quintuplicou a receita da Faleiro desde que assumiu.
Apesar de a empresa ter passado bons momentos nos últimos oito anos, de acordo com Faleiro Neto, ele enfrentou dias bem difíceis.
Muitas vezes, conta ele, chegava chorando até a porta da fábrica, mas, quando entrava na empresa, agia como se nada tivesse acontecido. "Foi difícil", afirma.
Um dos momentos mais complicados foi convencer a família que era hora de ampliar os negócios na linha de congelados para atender grandes empresas, não os clientes do bufê.
“Em 2015, tomei uma das decisões mais difíceis da minha vida. Fechei o bufê, com 63 anos, criado pelo meu avô, a contragosto de parte da família”, diz.
Mas Faleiro Neto tinha um argumento forte. O setor de bufê crescia entre 2% e 3% ao ano e, o de food service, 10%.
“As agências de viagem tomaram o mercado dos bufês. Quem faz bodas de prata ou de ouro prefere hoje muito mais gastar o dinheiro com viagem, que dura 20 dias, do que com uma festa, que dura menos de um dia”, diz.
A irmã mais velha, Aline, 37 anos, ficou no negócio com ele, e atua na área financeira. A mais nova, Marcella, decidiu montar uma confeitaria, que também herda o nome da família.
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FOTOS E VÍDEO: Fátima Fernandes/ Diário do Comércio e Divulgação
EDIÇÃO DE VÍDEO: William Chaussê