Brasil precisa fazer o ajuste das contas para não virar uma Grécia
Os economistas Marcos Lisboa, do Insper, e Ilan Goldfajn (foto), do Itaú-Unibanco, dizem que o governo precisa encontrar o quanto antes soluções de curto e de médio prazos para o ajuste fiscal
A possibilidade de um rombo nas contas públicas no próximo ano, que consta no Orçamento enviado pelo governo ao Congresso, aumentou as preocupações dos economistas sobre os rumos do país.
Dois deles, o economista-chefe do Itaú Unibanco, Ilan Goldfajn, e o diretor presidente do Insper, Marcos Lisboa, debateram sobre o assunto na manhã desta quarta-feira (02/09) no 9º Encontro Paulista de Fundações. O debate foi mediado pelo economista e sócio da consultoria GO Associados, Gesner Oliveira.
Lisboa, do Insper, disse que a situação do Brasil caminha para um cenário de insolvência, como o que a Grécia vive atualmente. Já Goldfajn afirmou que a incerteza sobre como o governo vai resolver o problema das contas públicas - se por aumento de impostos ou corte de gastos - abala ainda mais a confiança do empresário para investir.
O consenso é que o ajuste precisa ser feito com medidas de curto e de médio prazos. O governo precisará eliminar as distorções que fazem alguns pagarem mais impostos e outros menos, de setores que conseguem juros baixos e outros não.
O economista-chefe do Itaú Unibanco disse que é necessário "aproveitar a crise" para se repensar a rota da economia brasileira. Para ele, mesmo que não seja possível resolver os problemas estruturais de pronto, é necessário que o governo adote medidas pontuais para melhorar as condições no curto prazo.
No cenário atual, avalia o economista-chefe do Itaú Unibanco, a apresentação do Orçamento de 2016 que prevê déficit primário de cerca de R$ 30 bilhões é uma prova de que o "problema fiscal" está longe de ser resolvido.
Goldfajn, porém, destaca que alguns resultados do setor externo têm apresentado dados positivos nos últimos meses devido à desvalorização do real ante o dólar. "Parece que o impacto de câmbio e a recessão têm feito o ajuste fiscal ser mais rápido", avaliou.
Entre as consequências da mudança do nível do câmbio, o economista ressalta já ser possível perceber o surgimento de um processo de substituição de importações e, mais a longo prazo, haverá uma melhora das exportações.
"Mas isso não será suficiente para se fazer o ajuste. Vai levar bastante tempo para fazer efeito", estimou. Para ele, é difícil que o setor externo seja capaz de retomar o crescimento da economia brasileira, por não responder pela maior parte do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos pelo país).
Segundo Goldfajn, é preciso haver uma diminuição do déficit em conta corrente nos próximos dois anos, dos atuais 4,5% para 1,5% do PIB.
Para ele, para que este movimento ocorra, é necessário que a taxa de câmbio fique "um pouco acima" da atual.
Esta tendência, no entanto, tem reflexos negativos. "Ganhar competitividade pelo câmbio é a saída pela pobreza e pela queda de renda. Isso aumenta a inflação, acaba por reduzir a renda, o salário real e, de certa forma, reduz a circulação de moeda, mas às custas internas", afirmou.
A solução mais acertada para a competitividade passa, necessariamente, avalia, pela atração de investimentos o que, atualmente, esbarra na imprevisibilidade no horizonte econômico e na insegurança jurídica gerada pela necessidade do governo de rever renúncias fiscais e de aumentar impostos para equilibrar as contas públicas.
"Enquanto não for resolvido o problema fiscal, dificilmente haverá a volta da confiança. Se o agente que quer investir não sabe como o ajuste será implementado, fica se perguntando se alta de imposto ou corte de gastos aumentará ou não", exemplificou.
Por isso, destaca, a solução para o problema da competitividade só será possível quando o governo atacar os desafios atuais no âmbito fiscal. Ele lembrou que nos últimos quatro ou cinco anos houve, por parte do governo, um processo de negar a realidade, com a adoção de políticas econômicas de juros artificialmente baixos, câmbio controlado e abundância de crédito público.
Já o economista e diretor presidente do Insper, Marcos Lisboa, disse que se o governo não resolver o desequilíbrio das contas públicas, o Brasil caminha para a insolvência fiscal.
"Se não houver um debate sobre o que é preciso para os próximos anos nesse aspecto, enfrentaremos uma grave crise fiscal, como a Grécia, ou um longo processo de empobrecimento, como a Argentina", disse.
DOIS BRASIS
Para o diretor presidente do Insper, o debate sobre as questões fiscais que se impõe sobre o país é difícil. "Vamos fazer uma agenda de isonomia tributária ou continuar com regras que fazem muitos pagar muito imposto e outros pagarem menos?", questionou.
Segundo o especialista, atualmente existem "dois Brasis": um em que se paga 34% de impostos e outro em que se paga 9,5%, em referência a setores da economia que contam com alíquotas diferenciadas.
"Tem um Brasil que paga juros de mercado de 18% e outro em que se paga 3,5%", disse, em referência à política de crédito subsidiado incentivada pelo governo federal.
Segundo ele, apesar de não ser fácil, não estabelecer uma agenda para os próximos anos levará o país a estar condenado a um longo período de estagnação. Apesar da perspectiva não ser favorável, Lisboa pondera que as medidas necessárias não devem ser adotadas em um curto espaço de tempo.
"O governo poderia ter anunciado neste ano o debate de um cronograma de ajuste da previdência para os próximos 15 anos. Não é preciso abrir a economia amanhã, pode-se fazer este processo em 5, 7 anos, mas é preciso apresentar um plano", disse.
Porém, a opção por não fomentar o debate e uma direção à economia agrava o atual cenário de recessão.
"É preciso retomar o norte da economia desde a década de 90 até o início do segundo mandato do governo Lula, de economia mais aberta, mas pró-mercado e não pró-empresário", avaliou.
Segundo Lisboa, o Brasil já caiu para o pior desempenho econômico entre países emergentes que não estão em guerra, excetuando Argentina e Venezuela, casos mais graves, em sua avaliação.
Entre as situações que devem ser enfrentadas pelo país nos próximos anos, segundo Lisboa, está o crescimento do gasto com Previdência em um ponto porcentual do Produto Interno Bruto (PIB) a cada governo e a elevação dos investimentos em educação até o nível de 10% do PIB. "Não tem aumento de imposto de que dê conta disso", disse.
Para Lisboa, nesta trajetória e sem resolver questão fiscal, o país caminha para a insolvência. Um dos sinais que já apontariam nesse sentido é a situação das contas públicas nos Estados. "Não sei quantos Estados conseguirão pagar a folha de pagamento em 2016. O caso do Rio Grande do Sul é só o primeiro", afirmou.
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