Você acha que 2017 foi politicamente caótico? Espere então por 2018
Gravações de Joesley mudaram o rumo do mandato de Temer. Mas para o ano que vem existe como grande incógnita a sucessão presidencial
Um balanço da política brasileira em 2017 pode ser resumido numa só frase: “Tem que manter isso, viu?”. Partiu da boca de Michel Temer, referindo-se a uma mesada que supostamente compraria o silêncio de Eduardo Cunha, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, atualmente preso.
A conversa com Temer, gravada por Joesley Batista –hoje também preso –mudou o rumo do atual mandato presidencial, ao ser divulgada em 18 de maio.
O presidente conseguiu escapar de duas denúncias por corrupção, uma em agosto e outra em outubro, formuladas pela Procuradoria Geral da República e que, se aceitas pela Câmara dos Deputados, interromperiam seu mandato.
O fato é que Temer caiu na defensiva, enfraqueceu-se perante um Congresso fisiológico e terminou o ano sem aprovar a Reforma da Previdência.
Quanto a uma projeção sobre a política brasileira em 2018, os cenários estão em aberto pelos dez nomes que disputam a Presidência da República.
Eles podem baixar para nove se, em 24 de janeiro, Lula se torne inelegível no julgamento em segunda instância da Justiça Federal de Porto Alegre.
É um cenário complicado. Se os três desembargadores concordarem com a condenação e derem a mesma sentença – em Curitiba, com Sergio Moro, o ex-presidente foi condenado em julho a nove anos e seis meses – os recursos ficam mais difíceis.
Havendo divergência, o pelotão de advogados mobilizado pelo PT fará de tudo para que a inelegibilidade seja engavetada e a candidatura petista se torne um fato consumado.
É a opção mais temida pelo mercado, ao menos em razão do esboço de política econômica que Lula vem anunciando em suas caravanas.
Vejamos. Ele quer submeter a referendo as reformas aprovadas por Temer (trabalhista, teto dos gastos, talvez a Previdência). É um jogo que afundaria o país numa inédita crise fiscal.
Afirma que os investimentos públicos podem ser financiados por empréstimos compulsórios, sangrando os bancos, ou com parte das reservas cambiais.
E promete “taxar grandes fortunas” e aumentar a alíquota de IR dos que ganham mais, iniciativas que o PT não tomou nos 13 anos em que esteve no Planalto.
Essas heterodoxias assustam. Elas estão, no plano econômico e social, no mesmo patamar que a promessa de armar a população, feita pelo deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), cuja candidatura cresce na proporção exata da ameaça representada por Lula.
E a opção liberal e centrista? É uma área por enquanto congestionada, com Henrique Meirelles e Geraldo Alckmin, ambos bem abaixo dos dois dígitos das intenções de voto.
UMA BOLA DE CRISAL EMBAÇADA
Por enquanto, nenhuma bola de cristal permite imagens menos embaçadas das eleições em que o primeiro turno está marcado para 7 de outubro. Haja coração.
Comparada às turbulências horríveis de 2017 – na política, mas não na economia -, a sucessão de Temer provocará bem mais tonturas.
E, retrospectivamente, o ano que agora termina já foi minado por imprevisíveis emoções, todas elas desmentindo a ideia de um horizonte construtivo e calmo que o país mereceria depois da interrupção do caótico mandato de Dilma Rousseff.
A Lava Jato, cujo relator no STF, Teori Zavaski, morreu em janeiro em acidente aéreo, transformou as prisões brasileiras numa Ilha Caras de personagens famosos.
Começou com Eike Batista, preso em janeiro, e teve seu momento mais alto, no início de outubro, quando os R$ 51 milhões em dinheiro vivo, fotogenicamente localizados num apartamento de Salvador, levaram à cadeia mais um ex-ministro de Temer, Geddel Vieira Lima.
OS DEFUNTOS DE AÉCIO E CABRAL
Não foi bem prisão domiciliar, mas quase, o que vitimou o senador Aécio Neves, afastado por duas vezes de seu mandato, antes que o Senado o preservasse, em outubro, em sua poltrona no Congresso.
Mas o que sobrou dele, politicamente, foi uma simples sombra do jovem líder que em 2014 quase impediu pelas urnas um segundo mandato da presidente petista.
Aécio virou um zumbi que seus colegas de PSDB tiveram o prazer de vaiar em abundância, para desopilar o fígado da Convenção tucana, em 9 de dezembro.
Em termos regionais, a Lava Jato levou em peso a política fluminense para as páginas policiais. O ex-governador Sérgio Cabral foi quatro vezes condenado em 2017, com penas que já somam 84 anos. E com tendência de subir bem mais.
Ao lado dele, na cadeia, estão outros integrantes do mesmo grupo de crime organizado, a começar pelo presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani.
Com tamanha demonstração de competente serviço, a Lava Jato nunca esteve, paradoxalmente, tão ameaçada.
O ministro do STF Gilmar Mendes proibiu as conduções coercitivas. O novo chefe da Polícia Federal Fernando Segóvia dá claros sinais de que sua prioridade é livrar Michel Temer do inquérito de corrupção no Porto de Santos.
O indulto de Natal, promovido pelo Planalto. reduziu ou aboliu as penas de 37 réus condenados por Sérgio Moro, em Curitiba. E há um movimento no Judiciário para acabar com as prisões após a condenação em segunda instância.
A Lava Jato perde até com o fogo amigo. Seu nome é evocado por juízes e procuradoras que se recusam a aceitar o teto salarial e a Reforma da Previdência.
Para alguns deles, cortar privilégios é “conspirar” contra a operação desencadeada há quase quatro anos em Curitiba.
Esse conjunto de enredos é tão diabolicamente ruim que resta um único consolo: os bons números da economia.
A equipe econômica de Temer encerra o ano com invejável desempenho: desemprego em queda, produção em alta – ambos em níveis modestos -, mas inequívocos resultados na queda da inflação, na baixa de juros e na reanimação da indústria e no comércio.
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