Sem rumo e sem saída à vista
Previsão do BC de tombo da economia superior a 4% tira um pouco do que restou do fôlego da presidente com a crise
O estado de saúde do mandato da presidente Dilma Rousseff continua a inspirar cuidados. A previsão do Banco Central, de retração da economia em 4,08% em 2015, coloca mais uma vez o Planalto contra a parede.
Essa previsão não é fundamentalmente mais grave que os 3,8% de queda no PIB previstos pelo mercado no final do ano passado. Mas 4% é uma barreira simbólica, transposta na recente história republicana apenas em 1990 (-4,35%), com o Plano Collor, e em 1981 (-4,25), com a crise cambial do governo Figueiredo.
Diante a previsão de prosseguimento da recessão em 2016, Dilma se aproximará do biênio 1930-1931, quando a depressão norte-americana derrubou a cotação do café, e o Brasil foi ladeira abaixo por dois anos seguidos: -2,10% e -3,30%.
O atual cenário poderia ser reconfortante caso fosse provocado por fatores externos, como em 2009 (- 0,3%), ou se não existisse, como agora, a fusão entre crise econômica e crise política.
NA CÂMARA DOS DEPUTADOS
Nesta quarta-feira (17/02) o governo pode ter comemorado a manutenção de Leonardo Picciani (RJ) como líder da bancada do PMDB na Câmara dos Deputados. Ele deverá se opor ao impeachment. Para obter na bancada 37 dos 67votos para ser reconduzido ao cargo, exigiu uma nova operação fisiológica do Planalto sobre o Congresso.
Os peemedebistas terão oito dos 65 deputados na comissão especial que julgará na Câmara o processo de afastamento da presidente. Mas o processo não será apenas aritmético. Ele dependerá do tamanho do mau-humor dos brasileiros quanto à possibilidade de a presidente “fazer alguma coisa” pela economia.
É onde mora o pessimismo. Na última sexta-feira (12/02), em reunião do conselho do instituto que leva seu nome, o ex-presidente Lula disse que, se a economia não voltasse a crescer até julho, estariam comprometidas as políticas sociais implantadas em 2003.
Dependendo dos autores do cenário, há duas formas para voltar a crescer. Ou aumentar o crédito para favorecer o consumo - é o que acha a ortodoxia do Partido dos Trabalhadores, saudosa da “nova matriz econômica” – ou se corrige a gravíssima situação fiscal.
Apesar das simpatias do ministro da Fazenda pela primeira alternativa, Dilma está propensa a aceitar a segunda, mas por meio de duas únicas medidas: a CPMF e a reforma da Previdência, que ainda são dois embriões em evolução bloqueada pelo Congresso.
Para o imposto do cheque, o Planalto lançou como balão de ensaio uma distribuição equitativa do arrecadado para os Estados e municípios. O pressuposto é que os governadores (19 deles beiram a inadimplência) pressionariam suas bancadas em nome de um interesse imediato.
O problema do roteiro está, no entanto, na falta de controle efetivo dos Executivos estaduais sobre deputados e senadores e o fato de uma boa parte do Congresso rejeitar qualquer aumento da carga tributária. Se o governo quiser equilibrar o orçamento, argumentam, que corte mais gastos.
Em nome de que milagre, por exemplo, estão aumentando as verbas do Fies (bolsas universitárias que beneficiam estudantes e, sobretudo, empresários do setor educacional)?
PROPOSTA DO PT
Dentro do PT existe a proposta de uma cobrança diferenciada do tributo, algo de execução complicada. Além da alíquota de 0,38%, as faixas de maior renda pagariam mais, e as de menor renda ficariam isentas.
Não se sabe até que ponto a rede bancária e a Receita Federal poderiam praticar uma osmose em seus computadores para operacionalizar essa diferenciação.
A questão da Previdência é também complicada. Lula disse há dias a portas fechadas que sindicatos não deveriam fazer concessões que os afastassem de suas bases.
É politicamente impossível contentar os segurados e aumentar ao mesmo tempo o tempo de contribuição. Ou unificar calendários, como se cogita no governo, em que as mulheres perderiam parte de seus privilégios, ou algo que seja entendido dessa forma.
Esse conjunto de questões seria arduamente resolvido por meio de negociações em que o governo atuaria firmeza sobre sua base aliada. Mas tal hipótese é irrealista.
Some-se a esse horizonte tumultuado a atuação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, apesar de sua desmoralização pública, continua a ter forte voz de comando em sua bancada e na de partidos menores.
E isso em razão de prestação de favores agenciados a partir de propinodutos que têm como ponto de partida sua antiga e fisiológica aliança com governos do PT. Cunha se elegeu deputado em 2002, na mesma eleição que levou Lula pela primeira vez à Presidência.