Ode aos cavalos
O ex-presidente Figueiredo amava os cavalos. Com medo de cair do cavalo nesses tempos bicudos, Dilma prefere gozar os momentos de folga pedalando sua bicicleta na órbita do Palácio da Alvorada
O que o ex-presidente João Batista Figueiredo tinha demais nas horas de gozar as folgas na Granja do Torto, nos fins de semana, a presidente Dilma Rousseff tem de menos.
Raramente o general-presidente deixava de passar o sábado e domingo na granja. Figueiredo desfrutava da paz e tranqulidade que o Torto oferecia para montar seus cavalos de raça, lembrando dos longos anos que praticou equitação no Exército brasileiro.
Figueiredo gostava tanto de seus cavalos de estimação que numa de suas visitas a São Paulo chegou a declarar que gostava mais do cheiro do cavalo do que do cheiro do povo.
Dilma Rousseff é o oposto de Figueiredo. Nos quatro anos de seu primeiro mandato, a presidente promoveu apenas uma festa de repercussão na granja e, neste primeiro ano de seu segundo mandato, ela não esteve uma vez sequer na granja, provavelmente por falta de tempo e por culpa da crise que abala seu governo.
Com medo de cair do cavalo nesses tempos bicudos, a presidente Dilma prefere gozar os momentos de folga pedalando sua bicicleta na órbita do Palácio da Alvorada, para esquecer a ladainha das tais pedaladas fiscais.
O general costumava chegar na granja por volta das 6 da manhã. Foi numa dessas manhãs ensolaradas que ele foi surpreendido por um repórter que aproveitou de seu raro bom humor para perguntar se ele já estava escolhido sucessor do presidente Ernesto Geisel, informação que todo País esperava ansioso.
Figueiredo, surpreendentemente, respondeu que sim. Ele era o novo presidente da República. A informação saiu de uma baia. Sua confirmação exigiu uma edição extra do jornal que foi às bancas, em Brasília, ao meio-dia.
Apesar da diferença de idade, Figueiredo e Dilma entraram para a história na mesma época que não deixou saudade, mas de forma diferente. Quando jovem Dilma foi uma das caças dos generais revolucionários, depois de ser descoberta num aparelho clandestino que servia de reuniões dos participantes da luta armada. Presa, ela foi torturada nas prisões em São Paulo.
O general João Batista Figueiredo foi diretor do SNI -Seviço Nacional de Informação- antes de ser ungido presidente da República. Ele era o caçador e ela a caça.
Para ser fiel à história, é preciso registrar que Figueiredo não foi o primeiro presidente que se apaixonou por cavalos: antes dele, quem também foi exímio cavalgador foi o marechal Deodoro da Fonseca, primeiro presidente da República, eleito em 1890 pelo sistema do voto de deputados e senadores.
Figueiredo guardava seus cavalos na Granja do Torto enquanto Deodoro usava as baias do Campo de Santana, no Rio. Na sua época de presidente, o marechal Deodoro usava um gabinete cedido no Itamarati.
Só depois que o Congresso elegeu o primeiro presidente da República civil, o paulista Prudente de Morais (1894-1898) é que o gabinete presidencial foi transferido (em 1897) do Itamarati para o Palácio do Catete, ali funcionando até 1960, ano em que JK inaugurou Brasília e o Palácio do Planalto, que passou a ser a sede do governo.
O cavalo também tem sua importância na história republicana: ele participou de um dos atos mais importantes da vida brasileira que foi a da proclamação da República E foi em grande estilo.
Deodoro estava acamado nos dias que antecederam o 15 de novembro, data em que caiu a monarquia, obrigando o Imperador Pedro II a deixar o País. Era 1889.
Mesmo proibido pelos médicos e pela mulher de deixar o leito enfermo, Deodoro ficou sabendo que o tenente-coronel Benjamin Constant e outros conspiradores haviam determinado que o golpe final no regime monárquico seria aplicado na madrugada do dia 15.
Deodoro não teve dúvida: sabendo que sua presença era fundamental na duvidosa empreitada por ser um dos principais -senão o principal- líder militar, desobedeceu as ordens do médico e da mulher, saiu da cama, colocou a cela em um saco e se dirigiu para o Campo de Santana.
Lá, selou seu cavalo e se juntou repentinamente aos demais conspiradores republicanos. Ao ver a presença do marechal, a tropa criou coragem e seu dirigiu ao portão de entrada de Santana.
Os sentinelas de plantão não esboçaram qualquer reação ao ver que quem comandava os insurretos era o marechal Deodoro, que ingressou no local e dissoloveu a última reunião do ministério do Imperador comandado pelo Visconde de Ouro Preto.
Estava consolidada a República, ao mesmo tempo em que o marechal subia em seu cavalo para dar o grito "Viva a República" e decretar o nascimento do novo sistema político vigente até hoje no Brasil.