Lobby no Senado tenta desvirtuar a reforma trabalhista, diz Pastore
Economista e professor da USP fez palestra na ACSP. Disse que pressão parte sobretudo de sindicatos, inconformados com o fim da obrigatoriedade de pagamento do imposto sindical
A reforma trabalhista, já aprovada na Câmara em 26 de abril, corre sério risco em sua tramitação no Senado, onde a oposição, que antes reagiu de maneira desarticulada, aliou-se agora às centrais sindicais para ameaçar os senadores com os efeitos eleitorais de boatos – todos eles fantasiosos - sobre as medidas modernizantes propostas pelo governo.
Foi esse o alerta lançado nesta segunda-feira (15/05), na Associação Comercial de São Paulo (ACSP), por José Pastore, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP e reconhecido especialista em questões trabalhistas.
Ele foi o palestrante da sessão plenária que se reuniu em conjunto com o Conselho Político e Social (Cops) da ACSP, sob a presidência de Alencar Burti, presidente da ACSP e da Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp). Os trabalhos foram conduzidos pelo ex-senador Jorge Bornhausen, coordenador do Cops.
A reação contra a reforma trabalhista, disse Pastore, parte sobretudo dos 17 mil sindicatos “de gaveta que tendem a morrer ou se fundir com outros”, permitindo que apenas as entidades competentes sobrevivam, em razão do fim do imposto sindical, pago compulsoriamente todos os anos por cada assalariado.
Em suas campanhas, afirmou, os sindicalistas procuram tocar em “pontos eleitoralmente sensíveis e que estão sendo dramatizados”, como a suposta desproteção da gestante a um ambiente de insalubridade ou ao suposto fim das férias a que ela tem direito após o parto, medidas que, em verdade, a lei não prevê.
Dois conselheiros, o deputados Heráclito Fortes (PSB-PI) e o ex-deputado Índio da Costa (PSD-RJ), alertaram para o fato de que o Senado terá dois terços de suas cadeiras renovadas em 2018, o que torna os senadores mais vulneráveis à chantagem praticada com inverdades.
MENOR TAMANHO DA JUSTIÇA DO TRABALHO
Além disso, também entraram na operação advogados, juízes e promotores da área trabalhista, que perderão parte de suas atribuições, com a redução da importância da Justiça do Trabalho em suas instâncias.
Pastore disse ser correto o cálculo de que no Brasil 3 milhões de novos processos dão entrada anualmente nas varas trabalhistas, um número absurdamente elevado em comparação aos 135 mil dos Estados Unidos, 75 mil da França ou 6 mil do Japão.
Essa indústria dos processos judiciais sofreria por aqui um brutal emagrecimento, em razão não apenas da prevalência do princípio do negociado sobre o legislado – uma das pedras de toque da reforma -, mas também pela instituição de responsabilidades paritárias, como o fato de o empregado precisar arcar com os custos judiciais da causa que perdeu, algo que hoje não existe.
A prevalência do negociado sobre o legislado vale para detalhes como a duração do almoço. A CLT estipula uma hora. Pode-se agora negociar 30 minutos, se for conveniente para o trabalhador terminar mais cedo o expediente.
A CLT permanece em vigor, e se na negociação dos contratos coletivos a opção for pela antiga legislação, de 1943, é ela que prevalecerá.
“Nunca foi tão importante fazer campanha de informação para a população. E talvez seja esse o papel dos empresários nas próximas duas ou três semanas”, disse o palestrante.
Para ele, há questões paralelas importantíssimas, como a baixa produtivide do trabalhador no Brasil, que é de um quarto de um trabalhador norte-americano.
Ainda que a reforma trabalhista não atinja os encargos das empresas (décimo-terceiro, férias, FGTS), esse conjunto representa 104% a mais que o salário pago para cada empregado.
Nos Estados Unidos, esse acréscimo é de apenas 9%. Com isso, há uma margem infinitamente maior de questões a serem negociadas nos contratos coletivos. E é em razão dessa margem que os salários também são bem maiores.
REFORMA E NOVOS EMPREGOS
Pastore foi também indagado sobre a quantidade de empregos novos que a reforma Trabalhista poderia gerar. Ele disse existirem apenas estimativas.
O Ministério do Trabalho trabalha com o número de 5 milhões. O Banco Itaú calcula, por sua vez, que seriam criados entre 2,5 a 4 milhões de postos de trabalho.
Outro temor, desta vez unindo sindicatos e a Previdência Social, está no possível crescimento no número de pessoas jurídicas (PJs) entre os trabalhadores.
Pastore disse que, mesmo nos países em que essa forma de contratação está há muitos anos generalizada, a maioria da força de trabalho permanece a de assalariados contratados.
O projeto já aprovado pela Câmara, acrescenta, teve o mérito de “impor uma trava” de 18 meses para a recontratação de um ex-CLT pelo regime de pessoa jurídica. É um desestímulo à utilização do PJ como meio para baixar o custo da mão de obra.
Caso esse mecanismo cresça de maneira desordenada, no entanto, seria menor a contribuição dessa massa de trabalhadores à Previdência Social.
Dentro desse quadro, disse Pastore, “precisamos criar formas de proteção atreladas às pessoas e não aos empregos”.
Mesmo o serviço terceirizado de uma pessoa jurídica deve embutir a remuneração para o exercício de direitos essenciais, como a necessidade de férias e de um complemento para a aposentadoria oficial.
Pastore também discorreu sobre os princípios em que se concentram os méritos da reforma, como a combinação da liberdade com a proteção (a forma diluir as horas trabalhadas durante a semana) e a inclusão no mercado formal de trabalhadores até agora excluídos (recepcionistas de feiras que duram dez dias ou duas semanas).
O texto também permite que empregadores e empregados resolvam internamente suas desavenças, com comissões a serem eleitas dentro das empresas com mais de 200 empregados, e a possibilidade de apelo à arbitragem e não necessariamente ao Judiciário.
Em suas observações finais, Alencar Burti disse que a relação entre capital e trabalho é muito delicada, e que não seria sensato desprezar o trabalhador.
A mudança trazida pela globalização, disse ele, é que hoje os países disputam o mercado como se fossem grandes empresas. Estamos numa época fundamental para a ampliação das reflexões que atentem para as necessidades das partes envolvidas no sistema de produção.
FOTOS: Thais Ferreira/Diário do Comércio