Marketing político: uma história de verdades e mentiras
Antecessores de João Santana surgiram nos EUA no século 19. Os marqueteiros crescem quando as ideias políticas são mais fracas
O marketing eleitoral não está em discussão em razão das eleições municipais deste ano. O tema entrou em cena pela porta das controvérsias com a prisão, na última terça-feira (23/02), de João Santana, o todo-poderoso marqueteiro do PT.
Vamos esquecer os efeitos políticos e judiciais dessa prisão, com a possibilidade de a Lava Jato saltar de sua jurisdição – a Primeira Instância da Justiça Federal, em Curitiba – para indiretamente ameaçar o mandato de Dilma Rousseff.
E coloquemos o holofote no marketing, que em seu ramo eleitoral tem uma origem pouco clara. Alguns especialistas acreditam que ele surgiu na Casa Branca por meio de Mark Hanna, assessor do presidente William McKinley (1897-1901).
McKinley se tornou histórico por ter declarado guerra à Espanha – uma aventura que rendeu aos Estados Unidos os territórios de Cuba, Porto Rico e Filipinas – e por ter sido assassinado no início de seu segundo mandato.
Confirmou o precedente de Abraham Lincoln, assassinado em 1865, e antecedeu John Kennedy, que o foi em 1963.
O papel de Mark Hanna não era o de um assessor de imprensa. Ele aconselhava o presidente sobre a maneira de se exprimir com um vocabulário que provocaria a simpatia dos jornais e dos leitores.
No plano eleitoral, o marketing pela primeira vez associado a uma mídia eletrônica, o rádio, apareceu também na política norte-americana, em 1936, durante a primeira reeleição de Franklin D. Roosevelt. Tratava-se, na época, de sublinhar o papel do Executivo e os controles do Estado nos programas que estavam tirando o país da depressão de 1929.
Esse ramo de assessoramento se tornaria rotineiro a partir da eleição presidencial de 1952, que levou à Casa Branca o republicano Dwigh Einsenhower, militar de carreira e comandante aliado na Europa no fim da 2ª Guerra Mundial.
Ike, como era chamado, enfrentou e derrotou duas vezes o democrata Adlai Stevenson. Mas não por meio de debates pela televisão, que definiriam a sucessão dele, em 1960. Foi quando o democrata John Kennedy – um homem jovem e atraente, mas de voz escandalosamente aguda – operou com a ajuda de marqueteiros para derrotar, nas telas e nas urnas, o republicano Richard Nixon.
A televisão se tornou o grande palanque presidencial nos Estados Unidos, onde não há horário eleitoral gratuito e os marqueteiros precisam resumir, em 30 segundos, inserções publicitárias com mensagens fortes e elegantes.
A Universidade de Conecticut, com um centro de acompanhamento das campanhas presidenciais eletrônicas, considera que grande obra-prima foi produzida em 1968, quando o republicano Nixon tinha o campo conservador disputado pelo segregacionista e belicista George Wallace.
O filme mostra uma criança contando inocentemente as pétalas de uma margarida. Subitamente, a contagem muda de voz e de objeto. É a contagem regressiva para o lançamento de um míssil nuclear que destruirá o Planeta.
É a época áurea Joseph Napolitain, primeiro marqueteiro com clientes espalhados pelos dois partidos e o primeiro a ser qualificado de “political consultant”, nome da profissão em inglês.
Napolitain fez com seus métodos de persuasão a primeira campanha latino-americana altamente elaborada. Foi na Venezuela, em 1973, quando se elegeu presidente Carlos Andrés Pérez.
Na época, por causa da ditadura, não se disputavam eleições no Brasil. Mas a redemocratização, a partir das campanhas para governador, em 1982, trouxe de início uma tonalidade bem mais ideológica que marqueteira. Foi na qualidade de homens de oposição e contra o autoritarismo que se elegeram Franco Montoro (SP), Leonel Brizola (RJ) ou Tancredo Neves (MG).
Esse modelo perdeu força em 1989, com a primeira eleição presidencial. Fernando Collor de Mello, do PRN, elegeu-se com o apelo de uma parafernália de recursos que procuravam colar nele a imagem de um homem dinâmico e modernizante.
Seu adversário de segundo turno foi Luís Inácio Lula da Silva, que por sua vez representa dois modelos contraditórios com relação ao marketing político.
Na campanha em que perdeu para Collor, Lula se limitou a discursar única e exclusivamente com temas e enfoques limitados pelas discussões internas do Partido dos Trabalhadores.
Em 2002, no entanto, ao se eleger ao Planalto, ele já se tornara o “Lulinha paz e amor”, fabricado nas pranchetas do marqueteiro Duda Mendonça.
Emergiu, a partir de então, toda uma geração de marqueteiros políticos de boa reputação técnica, como, Chico Santa Rita, Nelson Biondi, Francisco Toledo e muitos outros.
E se criou algo muito peculiar à política brasileira. Quando há posicionamentos de forte conteúdo ideológico (o primeiro PT, o atual Psol, da extrema esquerda), as campanhas são carregadas pela militância.
Mas quando a militância definha, e as decisões dos partidos políticos caem nas mãos dos dirigentes, cresce proporcionalmente o papel dos marqueteiros. Eles privilegiam aquilo que o eleitor quer ouvir e não o pouco que o partido tem a dizer – e isso se eles têm na bagagem algum conteúdo.