BC tenta salvar o que pode da política monetária
Reação observada nas declarações de Alexandre Tombini indica mais rigor do BC na pressão exercida por Dilma Roussef. A presidente estuda reduzir meta fiscal
Em meio à devastação sofrida com o caos político e fiscal, o Banco Central (BC) vem tentando salvar o que pode da política monetária. O endurecimento do tom do presidente Alexandre Tombini faz parte dessa estratégia.
Outro dos seus elementos foram os recentes relatos, na imprensa, baseados em fontes da equipe econômica, dando conta de que o BC esperava uma surpresa positiva na inflação de preços administrados.
Foi um tiro na água em termos de expectativas. Desde meados de novembro, a projeção mediana do mercado para a inflação de administrados em 2016 saltou de 6,9% para 7,35%. Alguns analistas projetam 8% ou até bem mais.
As expectativas para o IPCA cheio em 2016 ultrapassaram o teto do intervalo de tolerância da meta (6,5%) em novembro e já estão em 6,7%. Analistas influentes passaram a trabalhar com projeções em torno de 7% ou mais.
Nesse cenário, o BC tenta evitar o desequilíbrio total das expectativas, o que só pode ser feito com a sinalização de novas altas da Selic. Vários profissionais do mercado esperam um ciclo de alta da Selic a se iniciar na próxima reunião em janeiro, que elevare a taxa básica em torno de 2 pontos porcentuais, podendo ser um pouco mais ou um pouco menos. Há consenso de que isto seria só o suficiente para restabelecer o juro real, em torno de 8%, de quando a Selic atingiu 14,25% no final de julho.
Nesse cenário, consideram que a sorte do BC estará quase que inteiramente condicionada a um mínimo de estabilidade política e de avanço na agenda fiscal, que permitam estabilizar o câmbio e evitar novos estirões de depreciação.
José Júlio Senna, diretor do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, nota que o recente discurso de Tombini teve uma pequena novidade - o fato de o presidente do BC dizer, negando a tese de dominância fiscal, que o desequilíbrio das contas públicas atrapalha, mas o Copom não deixará de agir. "É um fato novo e sugestivo de que o BC considera a hipótese de fazer um ajuste da taxa nominal nos primeiros meses do ano", comenta o economista.
José Márcio Camargo, economista-chefe da gestora Opus, tem uma visão diferente. Prevê que o ciclo de alta da Selic vai ser de 2 a 2,5 pontos porcentuais, mas acha que o BC deveria fazer mais. Quanto à queda da atividade, ele diz que "a única coisa que deveria afetar a decisão do Copom é a inflação - se a inflação está se acelerando, é sinal de que a recessão ainda não foi suficiente".
DILMA IGNORA QUEIXAS DE LEVY
Indiferente à ameaça do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, de deixar o governo caso a meta de superávit não seja mantida em 0,7% do PIB, Dilma Rousseff abriu ontem a possibilidade de revisar o valor. A intenção da presidente pode reduzir a meta por causa da forte resistência da base aliada no Congresso. Entre os parlamentares circula a ideia de tornar a meta flexível. O movimento pela mudança da meta também está presente na equipe da presidente.
Ela marcou uma reunião ontem no final do dia para discutir o assunto. O ministro do Planejamento Nelson Barbosa, um dos defensores da flexibilização da meta, esteve presente, mas Levy conversou com a presidente apenas por telefone.
Segundo fontes do Palácio do Planalto, a revisão da meta seria para um objetivo "mais realista", mas não para zero como defendem alguns parlamentares. A decisão será tomada nos próximos dias. O Congresso deve votar o Orçamento de 2016 na próxima semana, antes de entrar em recesso.
O compromisso da presidente com a fixação da meta de superávit 0,7% seria uma medida preventiva contra novos rebaixamentos da nota do país. O ministro da Fazenda disse ontem que um novo déficit primário nas contas públicas em 2016 - pelo terceiro ano seguido - seria "complicado".
Imagem: Agência Brasil