A Associação Comercial de São Paulo chega aos 123 anos batalhando pelo avanço do país
Melhorias no cadastro positivo, fim da carta com aviso de recebimento, implantação de câmaras de mediação e arbitragem foram algumas das conquistas da entidade ao longo de 2017
Ao longo de sua longeva trajetória, que nesta quinta-feira (7/11) completa 123 anos, a Associação Comercial de São Paulo (ACSP) jamais contou com recursos públicos -o que confere à entidade reconhecida credibilidade e independência de opinião.
"É o que confere autoridade moral para apontar falhas e gastos excessivos de governos", afirma Alencar Burti, presidente da ACSP. "E essa distinção é seu maior mérito e talvez a razão que tenha chegado até aqui."
Em períodos de ciclotimias econômicas, como o que o Brasil ainda atravessa, cresce a importância de entidades como a Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que batalha dia a dia para facilitar a vida de quem empreende. Não foi diferente este ano.
Quem acompanhou suas atividades neste ano pode avaliar resultados concretos. Uma delas, pelo bom funcionamento do cadastro positivo, bandeira da entidade desde que era uma proposta embrionária.
Em outubro passado foi aprovado no Senado o PLS 212, que se passar pelo crivo da Câmara dos Deputados permitirá a inclusão de consumidores nos bancos de dados de bons pagadores sem prévia autorização.
O crescimento do cadastro positivo tem potencial para reduzir a inadimplência em 45%, dando mais segurança a quem vende. Em última análise, o menor risco de calote também pode reduzir o custo do crédito, o que é bom para empresários e consumidores.
Outra luta da ACSP com desfecho positivo neste ano foi a derrubada da exigência de carta com aviso de recebimento para informar o consumidor inadimplente sobre sua negativação.
Sob o pretexto de proteger o devedor, em 2015 a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) aprovou lei que obrigou os birôs de crédito a adotarem esse tipo de carta.
Entretanto, a realidade se mostrou diferente. O aviso de recebimento precisava ser entregue em mãos ao devedor, o que raramente ocorria. Nesse caso, a única maneira de o comerciante reaver o crédito era o protesto em cartório, o que acabava onerando o consumidor, que tinha de arcar com as custas cartoriais.
Além disso, como poucos consumidores recebiam o aviso de recebimento, os bancos de dados de inadimplência dos birôs de crédito deixaram de mostrar a realidade do endividamento dos consumidores paulistas.
Em novembro, depois de muito diálogo ente a ACSP e deputados, a exigência do aviso de recebimento foi derrubada pela Alesp.
Também em 2017 a ACSP tornou realidade uma parceria que tem potencial para ajudar a reduzir a judicialização. Passou a funcionar na sede da entidade uma unidade da Câmara Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial (CBMAE), que permite às empresas deslindar problemas com fornecedores ou clientes sem a necessidade de entrarem com ações na Justiça. Na CBMAE é possível resolver conflitos extrajudicialmente em até 20 dias.
Durante este ano a entidade abriu as portas para nomes importantes das áreas econômica e política, que puderam expor e debater suas ideias. Um deles foi Paulo Rabello de Castro, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que apresentou na ACSP novas linhas de crédito do banco de fomento.
O especialista em relações do trabalho José Pastore também esteve na entidade em várias oportunidades para debater os efeitos da reforma trabalhista.
Ao longo dos 123 anos de atividades da entidade, várias conquistas foram consumadas com esforço e recursos próprios. E muitas outras batalhas continuam sendo travadas.
A ACSP apoia e tem difundido argumentos favoráveis à aprovação de um programa especial de refinanciamento de dívidas fiscais para as empresas do Simples Nacional.
Sem um incentivo aos moldes de Refis - que hoje só abrange grandes e médias companhias -, cerca de 500 mil micro e pequenos empresários estão fadados a fechar as portas.
A ACSP também se uniu a outras 30 entidades na tentativa de convencer o governo a não elevar as alíquotas do Pis e da Cofins, algo cogitado pela equipe econômica como forma de compensar as perdas com a retirada do ICMS da base de cálculo dessas contribuições.
"Estamos modernizando a entidade para que cada vez mais aqueles que estão à frente de pequenas e médias empresas, as mais atingidos pela recessão, se juntem a nós num esforço para atenuar efeitos devastadores da crise, como a ainda elevada taxa de desemprego", diz Burti.
A posição de independência de opinião não significa, porém, antagonismo. "Fizemos por merecer, graças à credibilidade, o apoio de diferentes esferas dos governos às nossas causas", afirma.
Na defesa de valores liberais consagrados, a ACSP permanece fiel aos princípios que seus fundadores imprimiram há dois séculos e que apontam, invariavelmente, para avanços relevantes para a sociedade brasileira e o país.
NOSSA HISTÓRIA
Estimulada pela riqueza do café, a cidade de São Paulo pulsava ao final do século 19. Pontos comerciais surgiam da noite para o dia no triângulo histórico formado pelas ruas Direita, 15 de Novembro e São Bento. A indústria despontava, as oportunidades de se fazer novos negócios atraíam empreendedores locais e estrangeiros.
Mas nem tudo era simples na vida do empresário de então. O crescimento acelerado da economia daquela proto-metrópole esbarrava nos serviços públicos arcaicos e nas leis antiquadas. Era preciso afinar a sintonia com o poder público.
Foi nesse quadro que em 7 de dezembro de 1894, no prédio de número 10 da rua da Quitanda, o empresário Antônio Proost Rodovalho fundava a Associação Comercial de São Paulo, tornando-se seu primeiro presidente.
No discurso de instalação da entidade, em 26 de janeiro de 1895, o primeiro secretário, José Duarte Rodrigues, expunha à elite paulista alguns dos objetivos da recém-criada agremiação. “... a Associação cria, entre o Estado e o indivíduo, forças coletivas, livres, que, por uma parte, dispensam o governo de intervenções, e por outro lado, desenvolve no mais alto grau o espírito de iniciativa... pois estamos acostumados a tudo esperar da ação dos governos”.
Lá se foram 123 anos, mas esse trecho de discurso que refletia os anseios da jovem ACSP poderia ser enxertado – sem perder a relevância – nas falas dos atuais dirigentes da entidade.
As lutas pela menor interferência do estado na atividade empresarial, a formação de cidadãos proativos, conscientes de seus direitos e deveres, são causas que se mantiveram atuais ao longo desse um século e duas décadas, e que hoje são traduzidas como lutas pela redução da burocracia, da carga tributária e pelo estímulo ao empreendedorismo.
O fato de as causas dos embates persistirem ao longo dos tempos não significa insucessos passados. Sugere que a capacidade para criar dificuldade à atividade econômica funciona em moto perpetuo.
Uma das primeiras conquistas da ACSP, datada de 15 de novembro de 1895, foi a instalação de uma alfândega seca na cidade de São Paulo. Até então, a burocracia exigia que os empresários fossem até Santos para assinarem a documentação que liberaria as mercadorias importadas.
O tempo passou, os lentos trens a vapor que subiam a serra do Mar deram lugar aos motores a combustão. Chegaram a telefonia celular e a internet – que reduziram as distâncias a um clique no mouse. Mesmo assim, liberar cargas no Porto de Santos pode levar dias, graças ao excesso de normas, criadas ao longo do tempo, e à ineficiência de infraestrutura.
Mas aquela conquista, que 120 anos atrás agilizou o trânsito das mercadorias, encontrou paralelo recentemente com a aceitação, pelo governo Federal, do projeto Porto 24 Horas. Moldado dentro da ACSP, ele prevê, entre outros pontos, o funcionamento ininterrupto em Santos de órgãos públicos como a Vigilância Sanitária e Ministério da Agricultura, visando agilizar os despachos.
Os protestos contra a tributação insana também encontraram eco através dos tempos. Ainda em 1900, a ACSP se posicionou contra a política estadual de ajuste financeiro de Campos Sales, que criava mais impostos ao setor produtivo. Também foi combativa, no âmbito municipal, questionando a legalidade da taxa de até sete contos de réis direcionada ao serviço de limpeza pública.
LUTA PELA REDUÇÂO DA CARGA TRIBUTÁRIA
Hoje, a ACSP se mobiliza para reduzir a carga tributária e conscientizar a população sobre o peso que os impostos têm no dia-a-dia de cada um.
Ações que ganharam corpo com o Movimento De Olho no Imposto, originado dentro da entidade, que trouxe como símbolo o Impostômetro – painel eletrônico que estima em tempo real a arrecadação dos governos Federal, estaduais e municipais –, e culminou com a aprovação da lei que obriga estabelecimentos comerciais a discriminarem na nota fiscal o percentual de tributos embutidos nos preços.
Desde suas origens, a ACSP tem se posicionado como a voz do empresariado, o que não diminuiu o papel social da entidade. Quando a São Paulo de 1918 foi assolada pela chamada “gripe espanhola”, a Associação saiu em socorro à população, trabalhando para a criação de um hospital na cidade, a Policlínica. De maneira semelhante, a entidade organizou frentes de assistência para garantir o abastecimento de alimento à população durante as revoluções de 1924 e 1932.
Hoje, esse papel de entidade-cidadã pode ser visto em ações como o Movimento Degrau, que tem garantido a inclusão de jovens no cotidiano das empresas, nas quais podem se iniciar como aprendizes.
Naquele dezembro de 1894, quando às 13 horas Antônio Proost Rodovalho, ladeado pelo presidente do estado de São Paulo, Bernardino de Campos, e por César Motta, secretário do interior, lançou a pedra fundamental da ACSP, ele afirmou: “São Paulo nunca deixará de crescer, de prosperar, de enriquecer”.
Poderia ter dito ainda que a ACSP entraria pelo tempo crescendo e se modernizando em consonância com a cidade, sempre mantendo vivos os seus princípios balizados pela livre iniciativa e apoio ao empreendedorismo.
FOTOS:Paulo Henrique Pampolin/Hype